Cdesc participou com atividades relacionadas a Desenvolvimento Alternativo na política sobre drogas
Resex Tapajós-Arapiuns, Santarém (PA), 6 de outubro de 2025 – Jovens indígenas de diferentes etnias e regiões da Amazônia se encontraram em Santarém (PA), entre os dias 29 de setembro e 3 de outubro, para uma semana de oficinas, palestras e trocas de experiências sobre proteção e vigilância territorial, desenvolvimento alternativo e prevenção ao tráfico de pessoas para fins de trabalho escravo no contexto da mineração, entre outros temas que perpassam as realidades dos povos indígenas do Brasil.
Organizado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC), o Encontro das Juventudes Indígenas reuniu mais de 30 jovens do baixo, médio e alto Tapajós, no Pará; das terras indígenas do povo Kayapó, também no Pará; e do Vale do Javari, no Amazonas. Mundurukus, kayapós, matis, mayuruna, boraris e tupinambás foram alguns dos povos representados.
O encontro – realizado no Centro Experimental Floresta Ativa (CEFA), na Reserva Extrativista (Resex) Tapajós-Arapiuns, em Santarém – buscou promover um espaço para fortalecer a vigilância e a proteção territorial frente aos impactos do garimpo ilegal e de crimes ambientais; incentivar projetos de desenvolvimento alternativo no âmbito da política de drogas, voltados à juventude; e prevenir casos de tráfico de pessoas e trabalho escravo, utilizando a comunicação indígena como estratégia central.
Três projetos do UNODC que atuam junto a populações indígenas na Amazônia estiveram envolvidos na organização da atividade: o Centro de Estudos sobre Drogas e Desenvolvimento Social Comunitário (Cdesc); o Tapajós – Projeto de Prevalência para Redução do Tráfico de Pessoas e Trabalho Escravo no Estado do Pará, Brasil; e o SAR-TI – Fortalecimento de Sistemas de Alerta Rápido e Resposta aos Crimes Ambientais e outros crimes relacionados à Mineração Ilegal do Ouro em Territórios Indígenas.
Além do UNODC, parceiros do Ministério Público do Trabalho (MPT), do Ministério dos Povos Indígenas (MPI), da Secretaria Nacional de Políticas sobre Drogas e Gestão de Ativos do Ministério da Justiça e Segurança Pública (Senad/MJSP), da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI), da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e do Coletivo Maparajuba participaram do encontro.
O Encontro de Juventudes Indígenas fortalece o compromisso do UNODC em traduzir o que está previsto nas Convenções Internacionais das quais é depositário — como a Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional (UNTOC) e seus protocolos sobre tráfico de pessoas, e as Convenções da ONU sobre Drogas — em ações concretas e inovadoras nos territórios indígenas brasileiros. Exemplos dessa conexão são os projetos Cdesc, Tapajós e SAR-TI, que integram políticas públicas e respostas locais com foco na prevenção ao tráfico de pessoas, enfrentamento aos crimes ambientais e promoção do desenvolvimento alternativo.
O Cdesc atua oferecendo assessoria técnica, pesquisas e atividades de escuta ativa junto às populações indígenas, buscando mapear demandas locais relacionadas ao uso de drogas e alternativas de desenvolvimento comunitário que valorizem cadeias produtivas sustentáveis, como na cadeia da farinha, e promovam a capacitação dos povos indígenas. O Projeto Tapajós, alinhado ao Protocolo da ONU sobre Tráfico de Pessoas, apoia iniciativas para enfrentar o trabalho escravo e o tráfico de pessoas na mineração de ouro da bacia do Tapajós, realizando diagnósticos, parcerias locais e intervenções focadas na prevenção desses crimes. O SAR-TI, por sua vez, fortalece mecanismos de alerta rápido, monitoramento territorial e proteção autônoma das comunidades, conectando o tema dos crimes ambientais decorrentes da mineração ilegal à atuação indígena, promovendo ainda capacitações e doações de equipamentos de georreferenciamento para aprimorar a vigilância e a resposta local.
“Daqui eu volto para o meu território feliz e orgulhoso por ter aprendido e discutido sobre temas muito importantes junto com jovens de outros povos e outros territórios”, afirmou Tumi Matis, da TI Vale do Javari, comunicador do coletivo Vozes do Javari. “Desenvolver o trabalho com a juventude indígena é importante para que, na frente, sejamos líderes e as futuras gerações possam colher esses frutos para nossas comunidades e nossos anciões”.
Particularidades e realidades compartilhadas
Os dias da programação abarcaram oficinas e palestras sobre diferentes temas, conduzidos por representantes e especialistas do UNODC e das instituições parceiras, a partir de uma etodologia que privilegiou construções coletivas, trocas de experiências e atividades práticas, reforçando a participação da juventude presente.
A dinâmica de abertura teve como pergunta central “O que é ser jovem indígena hoje em territórios pressionados pelo crime?”. Os jovens apresentaram as particularidades de cada território, além de realidades compartilhadas, como desmatamento e mineração ilegal.
Os assuntos elencados na introdução do encontro – proteção territorial, uso abusivo de álcool e drogas, prevenção ao tráfico de pessoas, desenvolvimento alternativo, comunicação e protocolos para denúncias de crimes nos territórios – foram aprofundados ao longo dos dias seguintes, intercalando exposições teóricas e atividades práticas.
No âmbito da comunicação, por exemplo, os jovens foram divididos em grupos, por território, e cada um desenvolveu uma proposta de campanha, estruturando mensagem-chave, público-alvo, problema social identificado, ferramentas de produção e estratégias de disseminação. Comunicadores de coletivos como Vozes do Javari e Associação das Mulheres Munduruku Wakoborũn e organizações como Instituto Kabu, Associação Floresta Protegida e CITA estavam entre os participantes.
Dentre as campanhas propostas, os jovens do Vale do Javari pensaram em materiais de sensibilização enfocando em mais cuidados com os indígenas que estão entrando no mercado de trabalho, com dois objetivos: chamar a atenção do governo, da sociedade e de parceiros para a falta de alternativas de trabalho na região; e evitar que jovens aceitem trabalhos que prejudiquem o seu território, como mineração e tráfico de drogas. Os produtos incluem posts e vídeos para o público externo e dinâmicas com os jovens nas escolas das comunidades do Vale.
Para discutir iniciativas de desenvolvimento alternativo como forma de geração de renda fora de economias ilícitas, o UNODC e a Senad/MJSP apresentaram conceitos e boas práticas e o MPT abordou a questão do trabalho justo e da prevenção ao trabalho escravo e ao tráfico de pessoas. Na sequência, os jovens elaboraram propostas para o desenvolvimento de cadeias produtivas a partir das potencialidades de cada território, identificando desafios, fatores positivos, possíveis parcerias e valores estimados.
No último dia, voltado à proteção territorial, uma oficina sobre denúncia de crimes ambientais detalhou quais informações devem ser coletadas em campo, como estruturar o texto de uma denúncia e quais órgãos devem ser acionados – conteúdo consolidado com atividade prática de escrita de uma denúncia completa.
Por fim, a Funai ofereceu uma oficina de geoprocessamento e uso de geotecnologias na proteção e gestão de Terras Indígenas. Com computadores disponibilizados aos jovens, a atividade explorou aplicativos e plataformas digitais de mapeamento, com exercícios de confecção de mapas, coleta e interpretação de informações ambientais e práticas de georreferenciamento.
“É muito gratificante participar dessa formação representando não apenas a nossa aldeia, mas todo o nosso território. O encontro nos proporcionou inúmeras alternativas para refletir e nos instigou a pensar em soluções para as nossas questões – e sempre nos ouvindo”, afirmou Railan Feitosa, indígena da povo tupinambá, da região do Baixo Tapajós. “Recebemos ensinamentos muito úteis para proteção territorial, desenvolvimento alternativo e trabalho. Tenho certeza de que os jovens sairão daqui com conhecimentos suficientes para estar na linha de frente da luta pelos seus territórios.”.
Projetos do UNODC
O Centro de Estudos sobre Drogas e Desenvolvimento Social Comunitário (Cdesc) é um projeto fruto da parceria entre o UNODC Brasil, a Senad/MJSP e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). As ações do Centro buscam estratégias integradas para garantia de direitos humanos, tanto em áreas urbanas quanto rurais, como especial atenção a periferias urbanas e povos indígenas e grupos mais vulneráveis.
TAPAJÓS é um projeto implementado desde 2021 pelo UNODC Brasil, no âmbito do seu mandato de assistência aos países na aplicação do Protocolo da ONU sobre Tráfico de Pessoas, com financiamento do Escritório de Monitoramento e Combate ao Tráfico de Pessoas (J-TIP) do Departamento de Estado dos EUA. Tem como objetivo identificar a prevalência de tráfico de pessoas e trabalho escravo no setor do garimpo de ouro na bacia do rio Tapajós, no estado do Pará, e implementar intervenções baseadas em evidências para redução e prevenção desses crimes na região.
SAR-TI é um projeto do UNODC Brasil realizado com o apoio do Ministério de Assuntos Estrangeiros e Cooperação Internacional da Itália (MAECI) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) através do ECHO da União Europeia. Tem como objetivo fortalecer os sistemas de monitoramento, vigilância, preparação e resposta para a proteção territorial indígena na região amazônica, garantindo ampla participação comunitária e sua integração.